quinta-feira, março 09, 2006
Desenvolvimento
A propósito de uma discussão e de uma troca de argumentos aqui, convém explicar algumas coisas sobre o debate em torno da depressão terceirense.
Se é verdade que não se pode reduzir a questão à dimensão do mercado, também não deixa de ser menos verdade que, quer na reportagem do DI quer na da RDP, o ponto de partida foi sempre o que é que o governo não está a fazer que devia fazer. As duas reportagens partiam, ainda, de um ponto de partida quase insultuoso, dando a entender que o crescimento de S. Miguel tem sido feito à custa das outras ilhas quando, na verdade, as outras ilhas só não desceram mais porque o mercado em S. Miguel tem evitado maiores sobressaltos. É por isso que aqui se paga mais pela electricidade, pelas passagens aéreas e pelos transportes marítimos ou pelos combustíveis. Sem dramas, sem discursos políticos e muito menos com reportagens fabricadas sobre supostos estados de alma.
Eu, pelo contrário, parto de outro princípio: os terceirenses devem perguntar primeiro o que é que estão a fazer mal e, só depois, o que é que o governo não faz e devia fazer. Assim como os faialenses, os jorgenses, os micaelenses e todos os outros.
Por exemplo, respondendo já a esta segunda pergunta, o governo não devia fazer o parque etnográfico, mas sim procurar outros investimentos de maior utilidade que possam verdadeiramente ajudar a desenvolver a Terceira. Continuando a responder, um dos problemas, deste governo e dos outros, é que boa parte dos investimentos em que se mete são quase sempre para consumo interno e muito pouco potenciadores para a agregação de investimento externo. Em S. Miguel, esse problema foi simplificado sem a presença do governo: a dimensão do mercado (nesta parte é inevitável) tem permitido a entrada de capital madeirense em vários investimentos. Ou seja, clarificando, um parque etnográfico destina-se, mais, a calar os terceirenses que acusam o governo de nada fazer do que representar uma estratégia para a ilha.
Depois, e referi isso no último Língua Afiada, as autarquias da Terceira perderam uma década a combater-se uma à outra. Fazem festivais de música semelhantes, fazem concorrência nos espectáculos e em diversas outras iniciativas. Para uma ilha da dimensão da Terceira, o poder local, que pode e deve ter uma estratégia comum de desenvolvimento, andou a fazer concorrência partidária esquecendo os interesses da população.
A descida estatística a que se assiste não é culpa do governo regional: é, em primeiro lugar, culpa de Sérgio Ávila e de José Fernando Gomes que preferiram sempre alinhar pelas estratégias partidárias delineadas em Ponta Delgada pelos directórios do partido. Talvez isso explique porque é que os dois partidos estão misteriosamente ausentes do debate. Em segundo lugar, é também culpa do próprio eleitorado terceirense que sucessivamente foi ratificando esta forma de fazer política nas urnas. Hoje, como se sabe, a câmara de Angra está praticamente falida e a da Praia da Vitória para lá caminha (já estaria provavelmente se o "menino" não tivesse caído no colo do PS).
Soluções? Várias, por exemplo uma comissão intermunicipal que possa, efectivamente, coordenar projectos comuns, encontrar formas de os calendários festivaleiros não exercerem concorrência directa entre os dois concelhos (ajuda, entre outras coisas, a ganhar mercado interno), verdadeiras estratégias conjuntas de promoção da ilha, enfim uma actuação conjunta que nunca existiu. Os empresários terceirenses (algunsestão a investir em S. Miguel mas não na Terceira o que também diz muito sobre o assunto) têm de perceber que precisam de arriscar e procurar mercados, actividades que permitam potenciar o seu desenvolvimento. Mais um exemplo? Vejam quantos empresários de S. Miguel estenderam a sua acção ao Faial depois do sismo e quantos é que foram da Terceira.
O pior que pode acontecer aos Açores é que aconteça com a Terceira o mesmo que aconteceu ao Faial. Que passou do estado de alma depressivo para o estado de coma profundo.
 
Postado por nuno mendes em 3/09/2006 |


1 Comments:


  • 09 março, 2006 15:52, Blogger Rui Messias

    Meu caro
    Obrigado pelo aviso do post... com o qual concordo na plenitude. Assim, escrito dessa forma, não parece um arauto de São Miguel mas quem, de facto, pensa no assunto. Perante esta argumentação, os meus parabéns e o desejo que a discussão não se fique por aqui ;)
    Abraço