Regressado a São Miguel, deparo-me com a caixa de comentários mais surrealista que alguma vez vi. Não esperava uma coisa destas, mas o tom utilizado pela maioria dos comentadores só me veio dar razão. Claro que, a partir do momento em que alguém colocou um link para este blogue num fórum de automobilismo, outra coisa não seria de esperar. Aliás, a maioria dos comentadores - já o comprovei - é continental e visitou pela primeira vez a blogosfera açoriana. Optaram por usar um tom insultuoso, mas eu já estou vacinado.
Mas deixemos a verborreia da maior parte dos comentários para falar sobre o acidente e a sentença do caso. Há 25 anos passei por uma situação idêntica. Dói bastante perder alguém muito querido num acidente. Revoltou-me, por isso, que há dois anos muitas pessoas ligadas ao desporto automóvel tenham tentado branquear a morte de uma pessoa nesse fatídico cruzamento na variante da Ribeira Grande. Afirmaram essas pessoas que não havia razão para a grande cobertura mediática do caso porque era um acidente igual aos outros, não tinha nada a ver com ralis e que as notícias mais não eram que ataques à modalidade. Até parece que pretendiam que se transformasse o caso em mais um mero número das estatísticas de sinistralidade.
O problema é que o piloto não estava propriamente "à civil", pois participava no SATA, o que atraiu a atenção dos jornalistas. Este não era mais um acidente, pela razão já indicada, mas, sobretudo, porque uma pessoa perdeu a vida. O que diria a sociedade se a comunicação social branqueasse o caso, como pretendiam alguns? Iria, certamente, censurar os jornalistas. E o que diriam os fanáticos se o condutor não fosse piloto de ralis, mas um político? Exigiriam que a comunicação social não largasse o caso e que a justiça actuasse. Aliás, eu só falei sobre este caso após ser conhecida a sentença do tribunal. Nunca o faria antes.
O fanatismo é perigoso, todos sabemos. Eu recuso-me a alinhar em manifestações destas. Não é por sair uma notícia ou assunto desfavorável ao "meu" Sporting que eu reajo como alguns dos malucos das claques. Penso pela minha própria cabeça. Não é por ser jornalista de profissão (afastado actualmente do meio) que aceito as barbaridades que a comunicação social muitas vezes comete. Já critiquei a classe várias vezes, sempre que entendi que as regras não foram respeitadas.
Este post destinou-se aos que quiseram branquear um caso e só vêem conspirações e papões em todo lado. O futebol causa muitas vítimas? Claro que causa. Até já serviu de pretexto a uma guerra. Mas não é para aqui chamado.
Felizmente que a maioria dos adeptos dos ralis não se revê na forma como alguns se manifestaram. Discutir a sentença, as causas do acidente e as condições dos ralis é uma coisa. Pode e deve ser feito. O resto é mero ruído.
Não quero terminar sem responder às únicas pessoas que se identificaram no meio de cento e tal comentários.
Caro Miguel, já falámos ao telefone sobre o assunto, mas também quero responder-te aqui. Os "doutos" jornalistas, como lhes chamas, fazem muitas vezes depender a cobertura de determinados casos da notoriedade dos envolvidos. Tu sabes isso. E quero acreditar que se nada disto se tivesse passado ainda não havia uma rotunda no local. O meu caso pessoal também não teve cobertura mediática e nem sequer mereceu um tratamento adequado da justiça, apesar das vitímas não terem tido qualquer culpa no sucedido.
Caro Abel Carreiro, não deturpe aquilo que eu escrevi. Os "maluquinhos", repito, são os que queriam que o caso fosse branqueado. E não digo que o piloto seja o único culpado. Mas foi único arguido neste processo e, como tal, o único condenado. São factos. Relativamente à sentença também há aspectos que me causam alguma admiração, embora só saiba o que foi noticiado. Não ouvi a leitura da sentença, como deve imaginar. Mas sem fugir ao assunto: nunca vi a culpabilidade determinada com percentagens; não compreendo que a multa a pagar ao Estado seja superior à indemnização para a família; acho estranho que a haver mais algum culpado este não esteja no banco dos réus;
Isto, e muito mais, merece debate. Não aceito é que alguns não quisessem cobertura mediática só porque iria prejudicar a imagem de algo que gostam, quando estava em causa uma vida humana que se perdeu.
Tas mas é caladinho e nao deites mais lenha para a fogueira. E que te sirva de exemplo para a proxima escrevers a noticia toda e como deve ser