sexta-feira, setembro 08, 2006
Pedagogia inútil
“Já gastámos milhares de euros em formação e sensibilização ambiental. Ainda há quem, infelizmente, não cumpra e começamos a perceber que é necessário apertar mais as regras”. Estas declarações de Ana Paula Marques, secretária regional do Ambiente, em entrevista à RTP/Açores, sobre a criação da Inspecção Regional do Ambiente, causaram-me alguma surpresa. Não pelo conteúdo em si, mas pela atitude da governante, que “atirou a toalha ao chão”, como se diz na gíria futebolística, em matéria de sensibilização ambiental. Mas desengane-se quem possa pensar que esta é uma crítica a Ana Paula Marques. É que há alturas em que é necessário “atirar a toalha ao chão” e procurar melhores soluções.
As diversas campanhas em prol da defesa do ambiente têm, certamente, contribuído para que cada vez mais pessoas façam a separação dos lixos, consumam água de forma moderada ou deixem de atirar lixo na orla costeira ou num qualquer penhasco. São cada vez mais os açorianos a respeitar o ambiente e ter a noção de que só com o esforço de todos é que aquela que é a maior riqueza dos Açores será preservada. Se muitos já tinham consciência desta necessidade, outros há que teimam em conspurcar tudo à sua volta.
Exemplo disso é a poluição na costa de São Miguel. Há alguns meses foi divulgado um estudo, coordenado pela associação Amigos dos Açores, que refere que a poluição na orla costeira micaelense aumentou de 2004 para 2005. Ou seja, mais lixo foi depositado na costa, apesar de todas as campanhas e alertas feitos nos últimos anos. Perante este triste cenário, há só uma conclusão a tirar: para os que teimam em não respeitar o ambiente a pedagogia não é solução, mas sim a repressão. Não no mais grave sentido da palavra, é claro. É preciso multar os prevaricadores, pois muitas pessoas só aprendem quando se lhes põe a mão na carteira. Esta análise pode parecer simplista, é certo, mas se a pedagogia não resulta com todas as pessoas, que solução se poderá encontrar para o problema? Tudo isto é mais que evidente.
No entanto, as autoridades na Região teimaram, ao longo dos anos, em não responsabilizar as pessoas pelos seus actos. Seja por negligência ou medo de perder votos, o certo é que muitas autarquias e departamentos governamentais nunca enfrentaram o problema de frente, preferindo aliviar a consciência com a realização de campanhas. Um dos muitos focos de poluição na costa de São Miguel fica junto ao porto de Rabo de Peixe. Os funcionários da lota disponibilizam aos pescadores caixas para o pescado, sem nada cobrarem por isso. Muitos pescadores «agradeceram» depositando-as na costa, em vez de as devolverem. Se isto já é muito grave, pior foi os funcionários da lota fomentarem este laxismo, pois continuaram a dar as referidas caixas àqueles que não as devolviam. Ou seja, o crime compensa. O problema concreto da costa de Rabo de Peixe salpicada de caixas azuis foi, entretanto resolvido. Uma acção de limpeza, que envolveu várias crianças da freguesia, pôs cobro ao triste cenário. Mas nada garante que, no futuro, esta lamentável situação se repita.
Por tudo isto, e muito mais, já é tempo das autoridades decidirem pôr cobro a estes atentados ao ambiente. A criação da Inspecção Regional do Ambiente é de louvar, desde que actue. Se não punir todos os que desrespeitam o ambiente será mais um organismo inútil. Tal como as acções de sensibilização ambiental o foram para muitas pessoas. Afinal, não são o leite, a carne ou os voos charter a maiores riquezas dos Açores. É a natureza.

Publicado no JORNAL DOS AÇORES
 
Postado por Rui Lucas em 9/08/2006 |


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