quarta-feira, junho 14, 2006
O jornalismo que temos
Este é um exemplo de mau jornalismo. Tentar levar o leitor a concluir que uma grávida perdeu o bebé porque a maternidade de Elvas foi encerrada é lamentável. O Nuno Barata chamou a atenção para a notícia em causa e, de forma pormenorizada, explicou porque é que se trata de mau jornalismo. Os leitores do Foguetabraze que comentaram o post concordaram com a análise. Até aqui tudo bem. Mas na minha opinião esta unanimidade só existe porque o assunto não nos diz respeito. Passa-se lá longe, para os lados de Portalegre – já agora, se Costa Neves tivesse sido eleito por aquele distrito o que teria ele a dizer sobre o assunto? Enfim, brincadeiras à parte, convém ver quem escreveu a notícia em causa: uma jornalista do semanário Linhas de Elvas. Aposto que se ela tivesse optado por fazer um trabalho com “pés e cabeça” a população de Elvas iria desancar o jornal.
Agora imaginemos que o governo central decidia (eu sei que não o pode fazer, mas vamos supor que podia) que os partos das grávidas açorianas passariam a ser efectuados em Lisboa. Uma decisão impopular, mas que até tinha fundamento. Imaginemos que uma grávida da Praia da Vitória perdia o bebé a caminho do continente. E imaginemos que havia um qualquer jornal açoriano que não embarcava no sensacionalismo e publicava uma notícia digna desse nome. Resultado: esse jornal seria fortemente atacado por não defender os “interesses” da Região e seria até, estou certo, apelidado de “anti-açoriano”. Este cenário é exagerado, eu sei. No entanto, já muitos jornalistas foram acusados de não respeitaram os “interesses” dos Açores. Infelizmente são poucas as pessoas que conseguem analisar estas questões de uma forma pragmática. Para algumas coisas os jornalistas “lá de fora” é que são bons e os “de cá” não prestam. Para outras é o contrário. Para mim o (bom) jornalismo e a verdade estão acima de quaisquer “interesses”, até da própria Autonomia, embora eu seja um autonomista convicto.
Concluindo, isto de “malhar” no jornalismo é fácil, embora os argumentos utilizados sejam quase sempre errados. A manipulação e o sensacionalismo existem, não ponho isso em causa. Mas o nosso comodismo e a falta de coragem de afrontar o poder são justificações mais acertadas para explicar o mau momento do jornalismo que se faz nos Açores e no resto do país. Só que a maioria prefere teorias da conspiração à Carrilho. Termino este testamento com um excelente diagnóstico do nosso jornalismo, feito por João Miguel Tavares, editor do Diário de Notícias:

“(...) os grandes pecados dos media nacionais são o comodismo, a desatenção, o respeitinho pelo poder, o alheamento da sua tarefa histórica de watch dog.”

Agora malhem na minha análise à vontade! :-)

 
Postado por Rui Lucas em 6/14/2006 |


4 Comments:


  • 14 junho, 2006 19:56, Blogger Nuno Barata

    Caro Rui
    Gosto de pessoas que não embarcam nos unanimismos mas este caso nada tem a ver com os que tu suposeste.
    Na verdade, quando uma grávida é evacuada ou internada às 23 semanas nada há a fazer senão rezar para quem crê e esperar para quem Deus não existe.
    Podias ter pegado no caso recente do parto a bordo de uma aerronave numa evacuação da terceira para São Miguel. Vamos supor que a criança ou a mão tinha uma fatalidade. O que acontecia nos media regionais?

     
  • 14 junho, 2006 21:11, Anonymous Anónimo

    há alguns problemas fundamentais no jornalismo portugues: O poder económico, os grupos, as linhas editoriais (para vender)... etc Claro que há comodismo e respeitinho pelo poder!!!!

     
  • 15 junho, 2006 00:17, Anonymous Anónimo

    há alguns problemas fundamentais no jornalismo portugues: O poder económico, os grupos dos media, as linhas editoriais (para vender)... etc Claro que há comodismo e respeitinho pelo poder!!!! Mas nem sempre!!! há tendencias!

     
  • 15 junho, 2006 00:24, Anonymous Anónimo

    ....desculpem pelos dois coments!!!

    Já agora... não é todo o jornalismo nem todos os jornalistas, como referi há têndencias!!!

    Não é o que se diz, mas sim o que não se diz!!! Esta é uma questão importante!