segunda-feira, novembro 28, 2005
Fingir-se morto
Dificilmente o PS/Açores poderá voltar a ter uma semana como aquela que passou. Depois do congresso, que sem surpresas mostrou o partido a curvar-se perante César, a discussão do Plano e Orçamento para 2006 não podia ter corrido melhor:
Com a oposição desaparecida, ténue, e nitidamente à deriva, os socialistas passaram triunfalmente pelo plenário do parlamento, muitas vezes sem ouvir, sequer, fosse o que fosse da parte de quem deveria questionar as prioridades do executivo.
Se a oposição ao governo parece ténue, os últimos dias mostraram que a oposição dentro da oposição tem matéria para dar e vender, como o demonstrou a guerra interna entre os autarcas do PSD/Açores, subitamente mobilizados contra Berta Cabral. No grupo parlamentar, se faltou oposição ao governo, também houve uma esclarecedora falta de solidariedade depois de um violento ataque de Ana Paula Marques à presidente de Ponta Delgada. Acusada de esbanjar dinheiro e de embaraçar a região em Bruxelas com os atrasos na instalação de tratamentos secundários na ETAR municipal, Berta Cabral não teve direito a uma palavra que fosse ou a um gesto de protesto que se ouvisse. Quem conhece as praxes parlamentares sabe que este é um tipo de atitude muito pouco comum. E reveladora do momento interno que os sociais democratas atravessam.
A autarca, aparentemente, parece estar agora a arcar com as consequências da sua não candidatura à presidência do PSD/Açores. É fácil, imaginar o que poderá acontecer a Costa Neves, se a sua candidatura conseguir chegar ao domingo do congresso. Coisa que começa a suscitar muitas dúvidas internas.
Aliás, a candidatura de Costa Neves, cada vez mais encarada como uma candidatura de Berta Cabral sem Berta, parece empenhada em colocar o PSD/Açores ainda mais efervescente: há um número substancial de actuais dirigentes que evita de todas as maneiras comprometer-se, outros recusam dar o nome para integrar as listas, e outros ainda, apresentam pesadas facturas. Ou seja, até agora, Carlos Costa Neves ofereceu uma federação de pequenos grupos num partido que caminha a passos largos para a balcanização.
Costa Neves apresentou-se aos deputados do PSD como o candidato ideal tendo em conta o seu currículo. Ou seja, Costa Neves pensa que basta ter tido muitas actividades para ter currículo. E que currículo é esse: secretário regional, por convite, eurodeputado eleito em listas nacionais, cargos governativos nacionais, por convite, e duas esclarecedoras derrotas eleitorais – uma em Portalegre, para onde emigrou e onde não conseguiu ser sequer eleito, e em Angra do Heroísmo, onde os seus conterrâneos demonstraram implacavelmente o que pensam do seu imenso currículo.
Nestes tempos, conturbados, há uma antiga frase salazarista que cada vez mais se aplica ao congresso do próximo domingo; “quem quer ter futuro, o melhor é fingir-se morto”. Não faltarão cadáveres por aí durante os próximos tempos.

2 – Os autarcas estão em guerra com o governo da República por causa dos fortes cortes financeiros impostos pelo Orçamento para o próximo ano. Contestam, e bem, o garrote financeiro que lhes tem sido aplicado. Por isso, tentar aprovar o pagamento de senhas de presença claramente desadequadas da realidade que se apregoa só pode ser entendido como uma ofensa aos contribuintes. Pagar-se principescamente por uma reunião mensal é uma falta de decoro incompreensível. E um sinal. Mau.
Nuno Mendes, Jornal dos Açores.
 
Postado por nuno mendes em 11/28/2005 |


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